Sem palavras
Escrevo e risco. Cada vez mais as palavras vão perdendo o seu sabor. Já não são as mesmas. A luta amarga entre letras e vocábulos que não se entendem, que não querem conjugar um presente (im)perfeito nem um futuro. Devo ter esgotado cada palavra. Já não é aquela sensação fantástica de soletrar cada uma das palavras. Não gosto do que escrevo. Não consigo acabar as frases. Agora, como nunca, ficaram presas noutra margem entre alegrias e tristezas. São palavras que não me servem, que não me podem vestir quando nua de sentimentos e de todos outros sentidos. Pior é a dor de não amar as nossas próprias palavras. É como fechar os olhos e sentir do outro lado das pálpebras um vestígio de loucura em género perverso e nocivo. Seriam apenas textos sem palavras como beijos sem boca, gemidos sem som, corpo sem alma. Preciso das palavras para descrever o que sinto e não sou capaz.